quinta-feira, 31 de julho de 2008

Noves fora zero.

Não saber o mal do mundo.
Não saber o que se sente e o que se quer.
É puramente um não saber mesmo,
Sem dor de ouvido,
Sem zumbido no pensamento.
Mesmo que te achem chato ou ridículo,
que o som do não dito seja alheio,
seja feio ou dorido:
o não sei é sempre o mesmo feito.
Não saber se peca o espanto,
se se nega o santo,
se se entrega ao encato;
se o pote está cheio,
se o copo é alheio:
visto-me das palavras incertas
e do meu imprevisto não quisto.
Não sei.
Nunca saberei se não o viver,
se não ocorrer a luta da indecisão.
E, ainda assim, quero vivê-lo intensamente,
para mesmo saber que não sei,
para ver se não sei,
e ter o breve encanto de se sentir vazio
de razão e direção.


[... quero a guanabara, quero o rio nilo, quero tudo ter, estrela, flor, estilo, tua língua em meu mamilo, água e sal. Nada tenho, vez em quando, tudo. Tudo quero mais ou menos quanto. Vida, vida, noves fora, zero. Quero viver, quero ouvir, quero ver...
Zeca Baleiro - Bandeira.]

sábado, 19 de julho de 2008

Dois.

Dois. Duas. Acho que todo mundo queria ter dois de tudo: duas músicas, dois nomes, duas vidas; dois bifes robustos, duas garrafas térmicas, duas técnicas para qualquer feitura de coisa útil. Dois: é um par em número e diversão. É um conjunto não-unitário e que denota uma esperança. É divisível por um e por ele mesmo, um número primo e par. E um número ímpar por isso. O único que é dois em um ao mesmo tempo. É um "bom encontro", é uma passarela de quadros e artes impossíveis de disjunção. É um beta-bloqueador simpático, amorfo, distonia perfecta em um. É o teclado de letras mil e um só pensamento para uma palavra. É uma tecla para o infinito. Quereria eu um dois. Ou duas. Duas vezes mil, duas vezes o ser humano, duas vezes a humanidade e todas as galáxias. Dois por um é dois. Dois por dois, um. É sempre assim quando se quer dois: caímos num jogo de um em dois para o sempre se eternizar perfeito. Dois, um. Um e mais. Duas pernas, dois braços, dois olhos e um coração. O ideal. E sem divisórias, pois o que se une e divide, não arma, não anda, não vinga: rasteja enfraquecido. O dois tem de ser inteiro, número inteiro, racionalmente inteiro e real. Um logarítmo de lógicas sensíveis, primo, par, indivisivelmente indivisível por ser um só, sem metade, sem carne lacerada, sem coração partido e sem mágoa. Sem que os cem fiquem sós. Ou virem sóis.
...
"E nós que nem sabemos quanto nos queremos
Que nem sabemos tudo que queremos
Como é difícil o desejo de amar
Você que nem me soube quanto eu quis
Que não coube, não me viu raiz
Nascendo, crescendo nos terrenos seus
Eu da janela olhando a lua, perguntando a lua -Onde você foi amar?
E nós que nem soubemos nos querer de vez
Estamos sós, laçados em dois nós
Um que é meu beijo o outro é o lábio seu
Não sei sair cantando sem contar você
Que eu sei cantar, mas conto com você
Que eu vou seguir, mas vou seguir você
Queria que assim sabendo se a gente se quer
Queria me rimar no seu colo mulher
Vencer a vida donde ela vier
Ganhar seu Chegar no chegar meu
Dar de mim o homem que é seu".
.
(Tadeu Franco - letra: Celso Adolfo)
.
[e lembro das tardes de violão com a doce e linda voz de minha mãe ao fundo cantando rouca e límpida essa que é uma das canções mais bonitas que existe... "estamos sós laçados em dois nós, um que é meu beijo o outro o lábio seu..."] .

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Em tese...

Outro dia uma amiga do interior, sabendo espertamente sobre minha monografia, perguntou-me sobre a temática pela qual me aporrinhei por meses a escrever. O título, nada esclarecedor, não ajuda a elevar minha alto-estima e egocêntrica vaidade. Claro, gozei-me, assim como minha amiga crítica literária, só de pronunciar o mote escolhido: Doenças de Acúmulo Lisossômico. -Hã?, disse ela e tantos outros que vieram indagar-me sobre pataquadas acadêmicas. Ao mesmo tempo que me gabava por um assunto tão microscópico, enchia-me de tédio olhar a estupefata cara de 'não entendi' da minha amiga tão interessada em trivialidades universitárias. A partir desse ponto, a conversa permeava-se de explicações, começando pela pergunta: - você sabe o que são lisossomos??? Caso a resposta fosse negativa, ia eu lá emprenhar-me de pensamentos biologísticos para esclarecer sobre esse orgânulo tão fundamental e visto somente ao microscópio eletrônico. Repetia: - lisossomos são um orgânulo citoplasmático que tem função de digestão celular. Quando positiva, já começava eu explanando sobre os malefícios que provocam a ausência de determinadas enzimas tão necessárias à degradação de subways, mc donalds e de todas as outras porcarias tão menos famosas e baratas que comemos em shoppings e biroscas diversas. E aí, pessoas do meu Brasil fantasmagoricamente varonil, quando aqueles hambúrgueres de minhoca com cheddar se acumulam nesses benditos e faltosos orgânulos, foi banda mel! Eles viram cada lisossomão! E isso traz um malefício absurdamente comprometedor para todo o corpo. Viram? não foi tão difícil e ardiloso assim.
Uma outra amiga minha, tão suficientemente paranóica com neurônios quanto Hannibal, trabalhou numa revisão sobre "o papel dos macrófagos da micróglia não-sei-fazendo-o-quê da esclerose múltipla". Provavelmente presepando, no mínimo, dentro das terminações nervosas do pensamento. Mas, a pergunta que não quer calar, ao ouvir esse tipo de tópico frasal é: - o quê?????. E nem adianta a cara de coerência de lier, fingindo um conhecimento de causa, pois não adianta. O que é mesmo micróglia???
Bem, caros colegas, a moral dessa história toda que vos apresento é, no mínimo, pitoresca. Não tenho idéia do porquê comecei a escrever toda essa joça sem nexo. E não tenho idéia do que seria a 'moral da história'. Acho que um pouco de picuínhas acadêmicas de conhecimento biologístico e médico nunca matou ningúem, né?

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Os dizê que dizem tudo!

Minha amiga diz que eu escrevo besteira com muita competência. E, de fato, eu escrevo besteira. Só me falta a competência, coisa muito rara nesses tempos de pessoas superficiais, quase lacônicas. Outro dia um menino veio me paquerar. Tudo bem, eu adoro as criaturas de Deus com atitude, principalmente os caras-de-pau. A questão é que, mesmo com todos esses predicados cativantes para um jovem de 19 anos, faltou-lhe o espírito esportivo. Sabem aquelas pessoas que são engraçadas, fazem você achar graça dos pombos da praça da sé, mas que não suportam brincadeiras com elas? Acho que esse foi o maior dos empecilhos para um affair mais humorístico e envolvente entre nós dois. Enfim, uma pena. Quem mandou faltar a coisa mais importante hodiernamente? A competência é uma coisa que se adquire congenitamente ou não, ou então vem com a genética herdada de uma boa família. No meu caso, não tomei nenhuma porrada de competência in utero. Uma outra pena. Mas, voltando aqui ao assunto principal do dia, eu preciso registrar aqui uma certa competência das pessoas do interior. Uma dentre tantas, claro. E a que mais me agrada, porque revela a criatividade e sabedoria que as folhas e chás de mato verde ensinam.
Certa feita, eu estava com a pessoa que eu conheço que mais diz os 'dizê' que dizem tudo: meu tio. Ele é mestre em soltar uma frase de efeito em qualquer ocasião. Todo dia ele me acordava retumbando por todo o quarto e sala: - passarinho que não deve nada a ninguém, já está acordado faz tempo. E nisso ia toda a manhã. Outra ótima dele é a "quem foi e não é mais é o mesmo que nunca ter sido...". Essa até que foi bem inteligente. Eu não estou dizendo que esse povo dos 'interiôr' é bão nos dizê, sô?
Um outro episódio muito engraçado foi quando um amigo meu entrou na casa recém-pintada de um outro amigo nosso. As paredes estavam tão alvas quanto ele era preto. Na cachaça, ele acabou por sujar uma boa parte destas paredes. Sanbendo do ocorrido, um outro amigo verbalizou: - preto quando não caga na entrada, caga na saída.
Vocês já viram que pra tudo tem um ditado? Certa feita, um amigo estava comendo acarajé. Nesta mesma noite, numa caganeira danada, ele jurou nunca mais comer a bendita guloseima. Claro, para esse mote, um amigo gaiato gritou: - cachorro mordido por cobra tem medo de lingüiça. Nada mais pertinente que isso. Óbvio.
De quando em vez, nós saímos para tomar uma cerveja. Numa dessas aí, eu e as duas outras figuras da mesa contamos as parcas moedas de 25 centavos e compramos a cerveja mais barata da bodega. Num estalo, ocorreu-me de lembrar daquele célebre dito popular: - em tempo de guerra, urubu é frango. Só para conhecimento geral de causa, estávamos tomando glacial, apreçada em R$ 1,20. Se não me engano, deu pra tomar umas 7. Depois veio a outra baixo-astral dizendo: vocês só não bebem esmalte, porque tira o esmalte dos dentes! Será que era ruim o que a gente estava consumindo? É, como diria o velho ditado: "depois de meia-noite, mocotó é lombo".
E ainda tem aquele povo que adora sacanear os ditados. Outro dia um amigo meu me larga essa: - água mole em pedra dura, tanto bate até que acaba a água. Um outro, muitíssimo engraçado, falou que "em terra de cego, jacaré nada de costas". Ai, esse povo realmente não tem o que fazer! E tudo vira uma lição de vida, até limão, abacaxi, tudo isso pra parafrasear aquela do pepino: - se a vida te oferecer um pepino, descasque-o. Igualmente isso com o abacaxi. Mas, com o limão, a coisa muda um pouco, porque, "se a vida te oferecer um limão, junte açúcar, gelo, vodka e faça uma caipirinha". Claro, ninguém perderá essa chance.
Por conta disso, para os cachaceiros, não poderíamos deixar de relembrar as clássicas de bares, botequins e botecos, escritas com esmalte na porta do banheiro, ou batom em algum pedaço remendado com durepox de espelho suspenso na parede por um fio de barbante em algum prego mal batido. "eu bebo sim, estou vivendo. Tem gente que não bebe e está morrendo". Um clássico, uma música extremamente pertinente para os dias atuais. Porque "é melhor ser um bêbado conhecido do que um alcoolico anônimo". Ou então aquela, "Hoje é um dia bom para tomar cerveja. Amanhã também, e assim sucessivamente". As pessoas não têm mais o que fazer, repito! Outra interessante é aquela que até doença colocam no meio, como se isso fosse uma coisa bonita: "Mal por mal, é melhor ter o de Alzheimer que o de Parkinson, pois é melhor esquecer de pagar a cerveja do que derramar tudo no chão". Eu concordo plenamente com isso. Mas, como é melhor "antes morrer de vodka do que morrer de tédio", vamos encerrar o assunto etílico por hoje.
Em relação às frases comparativas, as melhores na minha modesta e nada expert opinião, vejo que as pessoas fuçam a cachola para que o invento saia o mais engraçado possível. Quase sempre o é, principalmente quando as comparações são totalmente inusitadas e incomparáveis, por assim dizer. "Você está mais enfeitado do que barraca de capeta"; "Você tá mais parado do que velho com reumatismo"; "Esse tá mais na seca do que língua de papagaio"; Sem falar nas metafóricas frases: "essa grita mais que sirene de ambulância"; "essa menina tá metida a biscoito".
E, para terminar os ditos do dia, relembremos os bichos e suas traquinagens que viram os 'dizê' bem ditos. "Homem é homem e gato é um bicho que bebe leite"; "passarinho que come pedra, sabe o cú que tem"; "siri que dorme n'água, onda leva"; "prá quem tá afundando, jacaré é toco". Essas aí, tudo bem, tem um sentido até. Mas tem outras que, Deus nos acuda: "zebra sem lista é cavalo"; "pássaro que acompanha morcego, morre de cabeça pra baixo"; "você é meu e boi não lambe". Sim, e o kiko? Bem, eu não entendi nada. Tá, algumas outros ditos são endereçados às mulheres, que os marmanjos insistem em proclamar, jactando-se de uma liberdade um tanto duvidosa: "esperto foi o pato, que já nasceu com os dedos grudados". Por falar em esperteza, tem aquela que diz que "esperto foi o gato, porque nasceu de bigode". Algum tradutor árabe, por obséquio? Mas, esperto mesmo foi o carangueijo. Ah, esse sim foi muito esperto, porque "anda de lado para tirar o cú da reta". Não é verdade?
E eu vos pergunto, amigos fantasmagóricos que assombram essas picuínhas virtuais de dizeres um tanto sui generis para a espécie humana: "O que é um peido pra quem tá cagado???"